Sucessão de erros

Um episódio marcante na história de São José do Rio Preto, sem vítimas fatais, mas que trouxe grandes prejuízos aos proprietários dos prédios envolvidos e ao erário público, alterou diretamente o cotidiano de dezenas de pessoas e repercutiu por toda a imprensa nacional, foi a queda da torre Itália e a implosão das torres Portugal e Espanha, do mesmo condomínio, que ficaram popularmente conhecidas como “Torres Gêmeas”. Um conjunto de 03 edifícios de alto padrão, que começou a ser construído em 1985, na Av. Bady Bassitt, local nobre da cidade, com o m2 extremamente valorizado. As torres, de 17 andares cada, tinham um apartamento por andar e uma característica única à época que era a união dos três prédios por uma passarela no topo dos edifícios. E o que seria um marco para a arquitetura e engenharia rio-pretense, transformou-se em um pesadelo, principalmente para aqueles que tinham investido suas economias na compra de apartamentos que não custavam menos do que R$ 200.000,00, conforme avaliação da época (coberturas R$ 400.000,00), ricamente acabados e decorados com produtos do mais alto padrão. Quatorze famílias que já haviam se mudado para seus apartamentos e inúmeras outras que ainda investiam na decoração, viram seus sonhos reduzirem-se a um grande monte de entulhos, transformando suas vidas, suas lembranças e suas histórias para sempre.  

Madrugada do dia 16 de Outubro de 1997

Por volta das 2h30, moradores acordaram com estouros dos vidros de seus apartamentos. Às 5h51 foi acionado o corpo de bombeiros que retirou, em uma operação fantástica, 65 famílias das residências em um raio de 150 metros do local. O último morador da torre foi retirado às 6h10. Cinco minutos após, o edifício desabou.

 

A tragédia na visão de Toninho Cury

Na época da queda da torre Itália, Toninho Cury morava em apartamento localizado em um condomínio distante apenas cinquenta metros das torres.  

“Morava há cinquenta metros das torres Itália, Portugal e Espanha. O que vou relatar abaixo, é o que vivenciei durante os seis meses que passaram desde a queda da torre Itália até a implosão das torres Portugal e Espanha que, de perto fotografei e participei. Não sei se é privilégio ou não, mas fui o primeiro repórter a chegar ao fato. De calça jeans, chinelo e camisa de pijama, captei as primeiras fotos que, posteriormente, foram publicadas no jornal Folha de São Paulo. Não só fui o primeiro como o único a fotografar e participar de todos os acontecimentos e atos relacionados aos prédios desde a queda até a implosão, a retirada de entulhos e limpeza do terreno. Minha intenção, não sei quando, é escrever um livro esmiuçando fatos interessantes e até pitorescos dessa tragédia”.  

Sinais

“O prédio já dava sinais de algo errado com pelo menos um ano de antecedência. Minha funcionária, na época, pegava o mesmo ônibus de uma funcionária de um dos apartamentos do Edifício Itália. Em conversas mantidas durante o trajeto, sua amiga relatava que no Edifício Itália “só morava gente enjoada”. Seu marido era marceneiro e já era a terceira vez que ajustava portas de armários no edifício que sempre voltavam a entortar. Não só ele, como também um outro amigo, que era encanador, não conseguia tirar vazamentos de banheiras e ralos, pois o encanamento vivia rachando. Esses sinais nos levam a crer na frase de um engenheiro italiano que veio ao Brasil apenas para ver de perto a tragédia: ”O melhor amigo do homem é o concreto, pois antes de desabar envia os sinais”.”  

Bastidores

“No dia 15 de Outubro, véspera da queda do edifício, por volta das 14h, a Avenida Bady Bassitt chegou a registrar 38ºC. Por volta da 1h do dia 16, debaixo de garoa, os termômetros no local marcavam 18ºC. Coincidência ou não, houve de fato uma inversão térmica não muito comum na cidade.

Toda história tem um herói, e nesse caso, o zelador da torre Itália. No dia do desabamento, o zelador começou a ouvir muitos barulhos de vidros se quebrando e sons que pareciam tiros. Interfonou ao síndico que pediu que ele subisse para dar uma olhada. Às 5h10 da manhã, o zelador acionou o elevador de serviço, mas a porta não abriu, pois estava fora do esquadro. O zelador acionou imediatamente o corpo de bombeiros, falando categoricamente que o edifício iria desabar e a necessidade de tirar não só os moradores, como também a vizinhança. Ao chegarem ao local, os bombeiros constataram a informação e fizeram imediatamente o que fora dito.

Por volta das 6h12 um bombeiro estava a postos com uma câmera de filmar em suas mãos. Ao ver o prédio balançar deixou-a no banco da viatura e foi avisar o último companheiro que ainda estava na portaria do edifício. Juntos, saíram correndo e tiveram as costas marcadas com lama oriunda da água da caixa d’água que caíra há poucos metros dos policiais, quase ocasionando uma tragédia maior.

A torre caiu em linha, puxada pelo peso das escadas, atingindo de resvalo os Edifícios Camões, Paraty e um posto de combustíveis com seus tanques repletos. Apenas uma casa, onde residia e trabalhava um cirurgião dentista, foi atingida.

Em meio aos escombros, um advogado, aos soluços, retirava o seu pássaro de estimação intacto da gaiola.

Um caso no mínimo curioso. Por volta das 10h, quase quatro horas após o ocorrido, depois de todo o barulho da queda (ouvida há quase dois quilômetros), e com toda a movimentação de bombeiros, polícia, Defesa Civil, imprensa e curiosos, apareceu na janela de um dos prédios quase atingidos pelo desabamento, um jovem, que gritou: “O que está acontecendo?”. O rapaz havia acabado de acordar.”    

Dia 29 de Abril de 1998  

Foram seis meses repletos de disputas judiciais, laudos técnicos, análises de peritos, impasses políticos, moradores impedidos de retornarem às residências localizadas nos arredores das torres Portugal e Espanha e, finalmente, as torres foram implodidas.

Alguns defendiam que as torres não traziam perigo de desabamento, outros afirmavam categoricamente que iriam desabar a qualquer momento.

Os edifícios Portugal e Espanha foram reduzidos a uma montanha de entulhos trazendo de um lado tranquilidade para moradores dos arredores que, finalmente puderam retomar a normalidade de suas vidas, e por outro lado, a angústia para aqueles que viram seus investimentos caírem ao chão.