O 'santo' de Tambaú

Por Toninho Cury

Matéria publicada no jornal Diário da Região -

10 de Julho de 2002   


A história do padre Donizetti Tavares de Lima foge dos padrões dos religiosos brasileiros. Como de praxe, são de famílias simples, a maior parte vindos da roça. Pouco almejam na vida, a não ser ajuda ao próximo e o Reino de Deus. Filho de Tristão Tavares de Lima, rábula (advogado provisionado) e Francisca Cândida Tavares de Lima, professora, Donizetti tinha tudo para seguir carreiras brilhantes e estudar nas principais escolas do país. Mas não foi bem assim. Nascido na cidade de Santa Rita de Cássia, Minas Gerais, hoje apenas Cássia, no dia 3 de Janeiro de 1882. Aos quatro anos muda-se com a família para Franca, em São Paulo, onde conclui seus estudos básicos. Desde pequeno, Donizetti revelara uma veia religiosa e musical. Herdara de seus pais e avós esses dons. Desde cedo começou a tocar piano e ia muito até a igreja orar. Aprimorava suas técnicas musicais no órgão de pedais e fole da igreja local. Certo dia, num intervalo de seus estudos preparatórios para ingressar na Faculdade de Direito do Largo de São Francisco, em São Paulo, Donizetti executava alguns acordes no órgão, quando, do nada, apareceu o padre Nery, pároco local, que encantado com a execução e a dedicação religiosa do rapaz lhe questionara sobre o futuro: “ Você já pensou em ser padre?” A pergunta jogada ao ar despertou em Donizetti o interesse latente no sacerdócio. Aos 15 anos, Donizetti parte à São Paulo para cursar no Seminário Episcopal. Após três anos de estudos, ingressa no Colégio de Sorocaba. Volta a São Paulo, no Seminário, assumindo funções de principal organista e inicia seus estudos de filosofia. Em 1908, em Pouso Alegre, Minas Gerais, Donizetti Tavares de Lima é ordenado padre. Nesse mesmo ano, o padre Nery, que foi seu grande conselheiro espiritual, é ordenado bispo na cidade de Campinas, assumindo as funções naquela cidade. Como pessoa de sua maior confiança, o bispo Nery nomeia o já padre Donizetti como seu secretário. Depois de trabalhar em Campinas, o padre Donizetti dirigiu paróquias em Jaguariúna, Pouso Alegre, Vargem Grande do Sul e em 14 de Junho de 1926 assumiu a paróquia de São José, em Tambaú, onde permaneceu até o fim da vida. No dia 16 de Junho de 1961, morreu em Tambaú, padre Donizetti.

 

Diário de viagem


Ficou eleito pelos romeiros o dia 16 de Junho como o `Dia do Padre Donizetti`. Foi nesse dia, em 1961, que faleceu o padre. Este ano (2002), não foi diferente dos anteriores. Tambaú recebeu 20 mil romeiros. Desde a madrugada a movimentação era intensa. Centenas de ônibus, vans e automóveis tentavam estacionar pela cidade. Tarefa impossível nas imediações do Santuário. Às 8 horas da manhã, realizou-se a “26ª Marcha da Fé”. Foi um longo percurso desde a casa do padre Donizetti ao cemitério local onde foi realizada a Missa Campal. A grande novidade, foi a utilização do carro conversível que pertenceu ao padre Donizetti. Segundo consta, o automóvel foi um presente dado ao padre por um milionário ao alcançar um milagre. Existem várias histórias e contestações em relação ao carro, pois padre Donizetti era pessoa sem ostentação alguma. Resgatado de um ferro velho, o veículo, mesmo parcialmente restaurado, seguiu bem a “Marcha da Fé”. Nele, foram conduzidos o reitor do Santuário de Nossa Senhora Aparecida de Tambaú, monsenhor Décio Ravagnani e o bispo da Diocese de São João da Boa Vista, dom David Dias Pimentel, ex-reitor do Seminário Diocesano de Rio Preto, onde dirigiu várias paróquias. Durante todo o dia, o cemitério e a Casa do padre Donizetti estiveram lotados. É permanente na casa, uma estátua do padre Donizetti em tamanho natural. Construída no ano passado, com material sintético importado, seus detalhes superam as tradicionais estátuas encontradas em museus de cera. A obra é tão perfeita, que causava diferentes reações nos fiéis ao visitá-la. Ouvia-se gritos, choros e admirações. Pessoas que conheceram o padre Donizetti ficavam extasiadas perante a estátua. Ao filmar a estátua, no ano passado (2001), um câmera de uma emissora famosa, deu um passo para trás, dizendo: “está vivo!”, de tão real que é a obra. Inúmeras companhias de reis, congadas e violeiros estiveram no túmulo do padre Donizetti. Era uma mistura de música, dança e oração. Coisa pouco comum em cemitério. Como padre Donizetti foi grande amante da música, mesmo morto, via-se ao redor de seu túmulo, o que ele sempre quis. (TC)