Publicado sexta-feira, 24 de julho de 2009
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Dia desses, lá pelas bandas das Minas Gerais, uma congadeira fez um comentário ao me ver digladiar contra minha câmera ao trocar o filme. Também pudera, uma câmera Leica M3, com pelo menos 50 anos de fabricação, que necessita desmontar a tampa traseira para troca do negattivo. Tudo isso no êxtase da apresentação, quando as bandeiras dos grupos, em momento inusitado, se encontram. Deu certo. Usei as mãos, os bolsos e até a boca para segurar o filme batido. Em poucos segundos, estava “clicando” novamente, armado com 36 fotogramas da minha velha Leica. A congadeira disse: “tava vendo você apavorado trocando o filme da máquina. Fazia tempo que não via um filme. Aqui, era a antiga estação de trem de ferro. Me lembro bem, quando criança, chegava de Montes Altos e tinha um fotógrafo, tirando retratos com aquele pano na cabeça. Certa vez, meu pai pediu para tirar uma foto nossa. Tá lá na parede da sala. Meus filhos e netos sempre perguntam: cadê o trem de ferro da foto?” Enquanto ouvia a história contatada por aquela linda negra, descendente de escravos, vestida de azul e com as mãos calejadas, meus dedos se travaram. Mas, como um raio, relembrei toda felicidade que vivenciei, quando criança, com o “trem de ferro” de Rio Preto, nas viagens realizadas até São Paulo. Na semana seguinte, por volta das 18h, novamente estava eu com minha velha Leica, em frente a Justiça Eleitoral de Rio Preto, aguardando o resultado do segundo turno das eleições municipais. Entre os políticos e curiosos aglomerados no local, encontrei um amigo de infância. “Quem vai ganhar, Valdomiro ou Rillo?”, perguntou. “Tenha calma. O resultado já deve ter saído, o sistema eletrônico é muito rápido.” Dito e feito. As redações dos rádios, jornais e tvs transmitiam em tempo real os resultados vindos do TSE para todas as cidades que tiveram segundo turno e, Rio Preto, acabara de “fechar a fatura”. Valdomiro é o novo prefeito de Rio Preto. “E os trilhos de trem, será que o Valdomiro irá tira-los da cidade? O Rillo fez essa promessa, e o Valdomiro?” perguntou meu amigo. “O que você acha, é bom ou ruim tira-los daqui?”, retruquei. De repente me senti em frente a negra da congada de Minas Gerais. Meu amigo abaixou a cabeça e em uma volta ao passado dizia: “Rio Preto ficará triste sem o trem de ferro. Quantas vezes ao sair do trabalho, estressado, me deparo com o comboio. Espero um, dois, cinco ou mais minutos dentro do carro. Relaxo e muita coisa vem em minhas lembranças: os leitos, o bife à cavalo, o apito do trem...” Nesse momento esqueci do segundo turno das eleições. Ficamos muito tempo relembrando o mágico trem de ferro que tem a capacidade de nos levar à viagens fantásticas, mesmo em pensamentos. Com estas duas fotos borradas e a velha “Maria Fumaça” que outrora habitou a “Rio Preto Paulista”, desejo deixar na mente de cada um as lembranças de suas inesquecíveis viagens no trem de ferro.
Toninho Cury